quarta-feira, 1 de maio de 2024

XXXVIII

Encontro em ti, entre as chamas, refrigério

De salgado mar, de feliz laguna

Como o Sol invicto e a matrona Luna

Sou teu gêmeo ser neste grão mistério


Como podes, com o semblante sério, 

De gentil afã, meus tremores puna

E minhas misérias, dispenseira una

De venturas tantas, com meigo império 


Houve música quando a ambos as flechas

Transpassava-nos, vindas de um Menino

De alados saltos, com fatal façanha


Mas no que abre o Amor, a Fortuna fecha

De querer juntar-nos num maior destino,

Após a vida, na eternal campanha


01/05/2024

XXXVII

Das arbóreas ramagens conhecidas

Concede gentil memória que as salve

É de musa dote, como aos Gonçalves

Tiveram onze brotos acolhida


Co'irmãos oito foi Júlia concebida, 

De meu pai a mãe, a flor maior dos Alves

Iguala a Iracema, a Otília talvez

Soberba avó, da mãe minha guarida


De João veio ao mundo infante Juscelino

De José, sete anos mais, miúda Jane

Os dois se uniram e eis o filho seu 


Quisera eu um feminil ou masculino

Ramo (ou quem sabe então ambos se irmanem)

Ver florir de mim, como filhos meus


01/05/2024

sábado, 27 de abril de 2024

XXXVI

Vou-me do mundo dos meus olhos farto

Pois tudo quanto com meus olhos vejo

Agravos mostram, não do meu desejo,

Pois o contenho no antro de meu quarto


Aqui folguedos, lá frescores partos

Montoados de desordens vão sem pejo

Anunciações de tempos malfazejos

Espraiam-se por onde a mim me descarto


Os Elísios os tenho em meu recesso

Ora templo, então escola, teatro e arte

Mel, vinho e azeite e leite se aparelham


Tartáreo o mundo que lá fora esqueço

Geme e grita lembrando minha parte

Mais à morte esta vida se assemelha


27/04/2024

sábado, 20 de abril de 2024

Via Crúcis

Sentença vêm da mão condenadora,

Que açoita e ordena o trasladar do lenho.

Cadente em via, do pesado engenho,

O Filho via sua Mãe sofreguidora.


Do cirenaico ao ombro esgotado escora,

E as fauces deixa num pano, o Desenho,

E de novo caía em seu sozinho empenho,

Dizendo às damas paz consoladora.


Memorando auxílio, embora inda caísse,

E os guardas vinham despojá-lo as vestes,

Atando ao madeiro Mãos e Pés com pregos.


Morre do fel, embora água pedisse.

Assim descem-no da cruz, deixando Este

Sepultado em penha, meu Deus jazego.


20/04/2024

domingo, 3 de março de 2024

Pisces

Nuvens cerradas impedem de crer

Nos brilhos infindos de águas celestes.

Homens terrestres procuram-nas ver

Entre ilusões, por não terem as Vestes.


Ser como peixes, num mar a viver,

Até que uma rede do alto se apreste.

Vêm nos resgatar d'um grande sofrer,

E em Dia Pascal voará pelo leste.


Águas de Peixes são todos os prantos,

Que aos suóres e ao sangue formam um bálsamo,

Que enfim pode nos curar todos males.


No céu nadando cardumes de santos

Vêem os venturados, pois a Graça alça-nos,

Vêem no silêncio o que a vista lhes fale.


03/03/2024

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

XXXV

vigília infinda que exaurido velo
sem que me assista qualquer lenimento
não vôlto ao alto, baixo-me, cultuo a belo
no jardim de hipnos sofro banimento

ao cerro da luz não me é dado vê-lo
deito-me em perdição, viro-me, sento
ancoro no corpo e a alma faz selo
de vários lavores, de parco alento

contendem meu Guardião com os arcontes
dos éons, a serpe devora sua cauda
longa batalha perdida em tardança

fogem mistérios, das luzes as fontes
sonhar nesta vida esta via me balda
longe de Deus, perto da desvairança

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26/10/2023

terça-feira, 19 de abril de 2022

XXXIV

amplíssima torre de vasto engenho

que encerra os confins do livre pensar

transmitira-me as razões do vão empenho

de tudo poder sem nada obstar


levara-me a um posto a que cego venho

de nada obter em tudo divisar

para águas tranquilas guiou-me o lenho

e em áridas plagas não vejo o mar


só dissabores que me guiam de fato

a belos lugares de onde respiro

onde uma fonte pode me saciar


só quando em outros encontro o contato

enxergo, constato ao que me refiro

e vívidas fontes me vêm graciar


19/04/2022